sexta-feira, 2 de outubro de 2009

Eu, meu cigarro e a lei (parte I)


Eu, meu cigarro e a lei. Eis uma relação cada vez mais complicada. Afinal, faz algumas semanas começamos a viver sob as regras da novíssima Lei-Antifumo (ou anti-fumante? Ainda estou em dúvida!). O que equivale a muita polêmica e um bocado de gente chata que tende a confundir leis de controle e regulamentação do uso do tabaco com o direito de achar que o fumante deve ser extinto e desrespeitado: em geral, por aquelas pessoas que são acometidas por estranhas pulsões nervosas, quase sempre acompanhadas de caretas, toda vez que detectam um fumante no seu raio de visão. Contudo, as deixemos de lado. Não é sobre estas pessoas que quero falar. Mas sim, sobre a forma como o cigarro vem se transformando numa espécie de "cavalo-de-santo" ideológico através do qual se é capaz de justificar toda sorte de arbitrariedades, ingerências e sanções. Difícil dizer onde tudo isso vai parar, mas já conseguimos ter uma boa ideia.


Bizarrices, neste sentido, é o que não falta. Basta ter um pouco de paciência e estômago para acompanhar os noticiários, e ver a que ponto estamos chegando. Algumas reportagens são verdadeiras pérolas. Menciono apenas algumas:
"O Vegas, uma das casas noturnas mais frequentadas do 'Baixa Augusta', já se adequou à lei. Na entrada os fumantes são identificados com pulseiras. 'Durante a noite, liberamos grupos de 15 pessoas para fumar lá fora', conta Facundo Guerra, proprietário do club" (Casas Noturnas Criam Pulseiras Para Fumantes e Reforçam Segurança, Folha Online, 06/08/09). No entanto, não bastasse as simpáticas pulseirinhas sinalizadoras, a pessoa tem o seu cigarrinho confiscado temporariamente, sob pena de não entrar no estabelecimento. Continua a mesma reportagem: "na entrada, a revista recolhe os cigarros e os devolve somente na saída". De fato, é preciso perguntar para o infeliz dono da casa noturna em que parte da lei, a qual ele  se "adequou", está prescrito o uso de pulseiras e o confisco dos cigarros.


Já um outro bar, resolveu usar de um "bom humor" muito estranho para alertar os fumantes sobre a nova lei: "no O'Malley's [...] os seguranças estarão munidos de pistolas d'água 'para apagar, subitamente, o fumígeno ofensivo', como conta o proprietário do pub, Ali Visserman". Mas diz o dono, na maior cara de pau, "a intenção é jogar água somente no cigarro, e não no rosto das pessoas" (Polícia e Pistolas D'Água São Armas dos Bares Para Conter Fumantes, Folha Online, 06/08/2009). Pulseiras, revistas e atiradores de elite munidos de snipers d'água, estes são alguns dos absurdos e das paranóias que estão pautando nossa vida. O pior é que práticas como essas começam a soar normal, tolerável e mesmo desejável. Seria preciso uma paciência e um tempo que não disponho agora para lidar com os significados sociais e políticos destas práticas. Contudo, não deixa de ser assustador perceber como certos valores, quase sempre legitimados por argumentos que remetem a noções de "boa saúde" e assepsia social, estão interferindo e regulando nossa sociabilidade cotidiana. Lógico, isso não é de hoje. Mas o cigarro vem sendo a bola da vez. 


PS: A charge utilizada neste post foi tirada do blog do cartunista Rico, onde tem muita coisa legal: http://ricostudio.blogspot.com/

Nenhum comentário:

Postar um comentário